Estudo
traça o surgimento da pele branca entre os povos europeus
Com
a análise genética de antigas ossadas, pesquisadores descobrem que o
clareamento da pele foi um processo relativamente recente
O Globo
RIO
— Muitos imaginam que a Europa é o lar ancestral da população branca, mas um
novo estudo revela que a pele clara, assim como outras características, como
alta estatura e capacidade de os adultos digerirem leite, chegaram ao
continente em tempos relativamente recentes. O trabalho, apresentado na 84ª
reunião anual da Associação Americana de Antropologia Física, realizada no fim
de março em St. Louis, Missouri, oferece fortes evidências que os europeus
modernos não se parecem muito com os de 8 mil anos atrás.
Um
time internacional de cientistas analisou o genoma dos restos de 83 indivíduos
encontrados em sítios arqueológicos espalhados pela Europa. Os resultados
apontam que a população europeia moderna é uma mistura de pelo menos três
antigas populações que chegaram à Europa em diferentes migrações nos últimos 8
mil anos. Comparando com dados do Projeto 1000 Genomas, os cientistas
conseguiram encontrar quatro genes associados com as mudanças na dieta e a
pigmentação da pele que passaram por forte processo de seleção natural.
O
estudo confirmou que populações caçadoras e coletoras da Europa não conseguiam
digerir os açúcares do leite há 8 mil anos, assim como os primeiros povos
agricultores, que vieram do Oriente Próximo há cerca de 7.800 anos. Da mesma
forma, pastores Yamnayas, migrantes da região do Mar Negro há 4.800, não
possuíam o gene LCT, da lactase. Apenas há 4.300 anos que a tolerância à
lactose começou a se espalhar pela Europa.
Sobre
a pigmentação, os cientistas encontraram dois genes diferentes relacionados com
a coloração da pele, além de um outro, ligado aos olhos azuis e que também pode
contribuir para a pele clara e o cabelo louro. Os humanos modernos que migraram
da África para a Europa há cerca de 40 mil anos tinham a pele escura, o que é
uma vantagem para regiões ensolaradas. E o estudo confirma que há 8.500 anos,
povos caçadores e coletores na Espanha, Luxemburgo e Hungria também possuíam a
pele escura, pois eles não tinham os genes SLC24A5 e SLC45A2, que levaram à
despigmentação e à pele pálida dos europeus atuais.
Mas
no extremo norte, onde os baixos níveis de luz favorecem a pele pálida, os
pesquisadores encontraram um panorama diferente entre os povos caçadores e
coletores: sete corpos do sítio arqueológico de Motala, no sul da Suécia,
datados em 7.700 anos, possuíam ambos os genes ligados à pele clara, assim como
um terceiro, o HERC2/OCA2, que causa os olhos azuis. Dessa forma, povos
caçadores e coletores do Norte da Europa já possuíam a pele pálida, mas os das
regiões centrais e sul tinham a pele escura.
Então,
os primeiros povos agricultores chegaram à Europa, há 7.800 mil anos, vindos do
Oriente Próximo, também carregando os dois genes em questão. Eles se misturaram
às populações caçadoras e coletoras e espalharam o gene SLC24A5 pelas regiões
Central e Sul da Europa. A outra variante, o SLC45A2, se manteve em níveis
baixos de penetração até 5.800 atrás, quando começou a se espalhar pelo
continente.
A
altura é resultado da interação de diversos genes, mas os pesquisadores
descobriram que a seleção natural favoreceu variantes genéticas que favorecem
pessoas altas a partir de 8 mil anos atrás, mas com um impulso dado pela
migração dos Yamnayas, há 4.800 anos. Dentre as três populações que mais
contribuíram para o europeu moderno, eles eram os de maior potencial genético
para serem altos.
O
estudo não especifica porque esses genes passaram por tamanho processo de
seleção, mas existe a teoria que a despigmentação serviu para maximizar a
síntese de vitamina D, afirmou a paleoantropóloga Nina Jablonski, da
Unversidade do Estado da Pensilvânia. Pessoas que vivem em altas latitudes não
recebem radiação UV suficiente para sintetizar a vitamina, então a seleção
natural pode ter favorecido duas soluções genéticas para a questão. Evoluir a
pele clara para absorver mais radiação e favorecer a tolerância à lactose, para
se digerir os açúcares e a vitamina D encontrados no leite.
—
O que nós imaginávamos como um entendimento simples sobre o surgimento da pele
despigmentada na Europa, é um emocionante trabalho da seleção — disse Nina, em
entrevista à revista “Science”. — Esses dados são interessantes porque mostram
como se deu a evolução recente.
Fonte: O Globo - Acesso: aqui
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